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Futebol

A campanha do Boca Juniors até a final da Libertadores na visão de um torcedor

(por Carlos Pankiewicz)“Você tem um tênis do Boca”, disse meu pai. Eu devia ter no máximo quatro anos, fiquei procurando uma boca no tênis, literalmente. Anos mais tarde, eu entendi que era “apenas” um tênis azul e amarelo. Isso foi nos anos 80. Uma das minhas maiores felicidades como torcedor é ter visto o Boca se tornar sinônimo de Libertadores.Torcer para o Boca, para mim, veio antes de saber o que era futebol. De todos os esportes que meu pai me ensinou a acompanhar, o esporte “torcer para o Boca” foi o primeiro. Por isso eu não torço pelo Boca só por mim, torço por mim e por ele. Eu confesso, tem vezes que a coisa aperta que eu não consigo pensar em nós ficando triste por conta de um resultado negativo, que eu às vezes corro. Em 2003, o Boca perdeu o primeiro jogo das oitavas em casa para Paysandu. No jogo de volta, o pessoal da Universidade estava vendo Saturno em um telescópio, fui para lá. Em 2007, perdeu por 3 a 1 para o Cúcuta Deportivo da Colômbia nas semifinais, na ida. Banega parecia que nunca tinha visto uma bola. No jogo da volta fui para o cinema, pois pensei: “isso não vai dar certo”.O Boca foi campeão em 2003 e em 2007. Eu não faço isso sempre, na verdade só lembro dessas duas. Tirando elas estive sempre atento a cada minuto de jogo. Até que chegou a pandemia, e a disparidade econômica entre os times de Brasil e Argentina atingiu um nível que nem toda a identificação do time e da torcida com a Copa Libertadores seria suficiente para ser competitivo. Ficou evidente quando o Santos não teve nenhuma dificuldade para vencer por 3 a 0 nas semifinais em 2020. E cabia mais.O começo da edição de 2023 me fez ter vontade de ir ver Saturno ou ir ao cinema. O Boca tinha acabado de trocar de técnico. Saia o interino Hugo Ibarra, lateral direito das conquistas dos anos 2000, e entrava Jorge Almirón, vice da edição de 2017 com o Lanús. O time era uma bagunça, reflexo da administração encabeçada pelo ídolo Riquelme. Como dirigente é pior que muitos que temos aqui no Brasil. Só aceita gente da “turminha” dele.E não é que Almirón colocou as coisas nos eixos? Fez vários testes, muitas vezes desconexos, mas muitas vezes acertou, como quando passou o peruano Luís Advíncula da lateral para a ponta, mas aí resolveu que não ia mais fazer, mesmo tendo dado certo. Descobriu o menino Valentín Barco entre os juniores, mas reluta até hoje em deixá-lo atuar os 90 minutos. Passa longe de ser uma unanimidade.La Bombonera ainda pulsa e pulsará para sempre, e assim empurrou o Boca, apesar dos pesares. Os problemas são incontáveis: investimento relativamente baixo, time bagunçado, jogadores com problemas fora de campo, mas o grupo era acessível. Mesmo assim, empatou com o Monagas na Venezuela, perdia para o Deportivo Pereira em casa, mas conseguiu virar com dois gols nos acréscimos, depois perdeu no jogo da volta. Só o Colo-Colo que não deu muito trabalho. Aliás, até deu, mas não levou nenhum ponto.Sorteio das oitavas. Aí eu corri. Fui saber depois. O risco de pegar o Flamengo ou algum time mais bem acertado era muito grande, e qualquer um dos outros 15, na minha cabeça, estava mais acertado que o Boca. Meu pai me avisou que seria o Nacional do Uruguai. Tradicional, perigoso, mas dá para conversar. Sem gols no Uruguai. Na volta, a estreia de Edinson Cavani, uma contratação como há muito não se via no Boca, mas o Nacional insistia em não sair da frente. Depois de muita luta, fomos para os pênaltis. Sergio Romero assumiu a titularidade há pouco tempo, depois da saída de Rossi e não estava passando muita confiança. Ele seria o mesmo pegador de pênaltis implacável da Copa 2014? Sim. Ele seria.Duelo doméstico contra o Racing, de muitas disputas recentes: Campeonato Argentino 2022, Copa da Liga Argentina 2022, que o Boca levou. Eles levaram uma Supercopa e um torneio que fizeram para vender para os árabes, que foi a despedida do Rossi. Gol polêmico no último minuto e os jogadores voltaram para a Argentina se hostilizando no avião. Delícia de clima para as quartas. Depois de dois 0 a 0 bastante disputados em que o Boca começou a dar sinais de que voltaria a “falar sério” em uma Libertadores, Romero já era uma segurança. De volta às semifinais.O Palmeiras, adversário mais rico, mais organizado e mais acostumado à hora da onça beber água na história recente da Libertadores, representava, na minha cabeça, uma barreira praticamente intransponível, mas não vinham jogando tão bem, então, quem sabe, se o Boca fizesse as duas melhores partidas dele no ano, de repente dava.E ele fez. Reparem que as duas melhores partidas do ano foram suficientes apenas para empatar os dois jogos contra o Palmeiras, mas que seja, Romero já era uma certeza. Final em jogo único. Essa o Boca ainda não viu.O adversário? Adivinhe. É mais organizado, tem folha salarial bem maior, jogadores mais cascudos e melhores tecnicamente, mas ninguém vai me convencer que nessa edição de 2023 a camisa do Boca jogou sozinha, empurrada pela torcida, e quaisquer 11 jogadores que estivessem dentro dela (não, pera, 10 mais o Romero) iriam de carona, sem vencer um mísero jogo de mata-mata, para a final no Rio. E quando a camisa do Boca joga de fato, coisas boas acontecem. Eu desconfiei que pudesse vencer no Mangueirão lotado em 2003, achei que o Banega era o pior volante do Mundo em 2007 e não achava possível chegar ao Rio em 2023. Nem de longe. Das outras vezes deu sorte. Tomara que dê esse ano também!

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