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Automobilismo

Mas, afinal, automobilismo é esporte?

(por Anderson Rodrigues)Para começar, podemos falar da aplicação de treinamentos físicos para pilotos. Até os meados dos anos 80, os pilotos não eram conhecidos por terem preocupação com seu preparo físico, pelo contrário, esses eram muitas vezes conhecidos por suas vidas boêmias. Existiam exceções, como por exemplo, Ken Miles, quem ficou conhecido do grande público no último grande filme que teve automobilismo como temática, Ford vs Ferrari. Miles, um ex-oficial do exército britânico, percebeu que todo o treinamento que teve durante sua vida militar, poderia ser aplicado também na sua atuação como piloto.Porém, os relatos mais claros de aplicação de treinamentos físicos para pilotos vem com a parceria entre Ayrton Senna e Nuno Cobra. Segundo relatos que constam em literaturas diversas e também no livro “Ayrton Senna — O heroí revelado”, Senna sofreu durante o Grande Prêmio da África do Sul de 1984 (disputado no autódromo de Kyalami) com a falta de preparo físico mediante a exigência física dos carros da época (ele pilotava um Toleman com potência de 700 cavalos) e o forte calor que acometeu o circuito no dia. Diante disso, o piloto procurou ajuda e daí iniciou-se a parceria que talvez tenha mudado os rumos da carreira de Senna, com o preparador físico Nuno Cobra.Segundos relatos do profissional, o piloto não tinha qualquer preparo, podendo desmaiar após 25 minutos de corrida. Essa parceria rendeu muitos frutos, fazendo com o preparo do piloto melhorasse de tal forma, que ele pudesse ser confundido com atletas de atletismo, por exemplo. Senna consegui o tempo de 26m45s para a distância de 4000 metros, depois de 1 ano de treinamento com Cobra, e após 8 anos, o tempo para a mesma distância era 1 segundo acima do recorde brasileiro da época, de 13m36s. Além disso, todos seus índices físicos e metabólicos sofreram grande melhora, influenciando em sua pilotagem física e mentalmente, pois um corpo cansado faz a cabeça falhar.A nova abordagem de Senna fez com que os outros pilotos corressem atrás de profissionais que lhes auxiliassem a melhor a forma física, fazendo com que hoje um profissional físico e um fisioterapeuta sejam integrantes obrigatórios do staff de pilotos e equipes, sejam essas das categorias principais ou de base. E esses pilotos hoje normalmente tem um esporte como base de sua preparação, pois todos eles precisam de uma base de fortalecimento além da necessária para suportar a exigência dos carros que esses pilotos pilotam. Na F1 atual, Bottas e Alonso são ciclistas, sendo que o segundo teve uma equipe própria de ciclismo, que não foi para frente por causa do custo do esporte.Outro exemplo recente é Jenson Button, triatleta, já completou inúmeros eventos do esporte e já organizou um evento solidário chamado Jenson Button Trust Triathlon.Se você leu até aqui, talvez você esteja se perguntando: mas isso não é evidência de que automobilismo não seja um esporte! Tendo a concordar contigo se eu lesse só isso mesmo. Então é hora de aprofundar o assunto.A definição de esporte coletivo é “trabalho em equipe que inclua qualquer número de indivíduos que tenham como objetivo competir contra outras equipes com o objetivo de vencer”. Hoje um time de F1 tem em média 450 funcionários que atual diretamente em confecção e manutenção de carros, além de trabalhar em todo ecossistema de uma etapa, trocando pneus, ajudando os pilotos, etc. Quando Eliud Kipchoge corre uma maratona, o mesmo tem toda uma equipe de profissionais como preparadores físicos, fisioterapeutas, nutricionistas, etc., para suporta-lo a ser um dos maiores maratonistas da história.Você pode ainda me questionar: “mas ele não tem engenheiros para lhe entregar o melhor tênis!”. Aqui eu tenho uma péssima notícia para você, mas preciso voltar 25 anos…Após as olimpíadas de Atlanta, em 1996, a natação viveu o ápice da sua evolução tecnológica, com os trajes que usavam materiais que faziam com que os nadadores flutuassem e/ou deslizassem mais rápido pelas piscinas do mundo. Vimos grandes marcas lançando trajes quase que trimestralmente no intuito de bater os concorrentes, e com isso recordes que perduravam a anos serem dizimados, com uma facilidade peculiar.Após anos de desenvolvimento e envolta a diversas polêmicas, a FINA (Federação Internacional de Natação) resolveu regulamentar os materiais que poderiam ser utilizados para a confecção de um traje esportivo para um nadador, e quais peças ele poderiam utilizar, dependendo do gênero. Com isso, podemos fazer uma correlação com os regulamentos técnicos das categorias de automobilismo, que quase sempre buscam coibir alguma inovação que buscar melhora de performance, mas que podem fazer os custos aumentarem significantemente, fazendo com que o dinheiro seja uma das variáveis mais importantes para se chegar a uma vitória. Podemos citar um exemplo recente, como o DAS (Double Axis Steering), que foi desenvolvido pela Mercedes AMG F1, que consistia em um mecanismo no volante para o piloto mover esse para frete ou para trás quando o carro estivesse em uma reta, para que esse tivesse mais tração e mantivesse a temperatura dos pneus uniforme, já que os pneus tem inclinação vertical (cambagem) para auxiliar nas curvas. Outros exemplosOutro exemplo do esporte que está ocorrendo atualmente, que pode ser usado para fazer essa mesma comparação feita com os trajes de natação, são os os tênis com entressola de fibra de carbono. Tudo começou quando a Nike lançou o seu modelo chamado Vaporfly 4%, baseado em um estudo de 2017, que dizia que o uso de fibra de carbono na confecção dos tênis poderiam ajudar na melhora do tempo total da maratona em 4% por atletas profissionais (para o recorde da época, isso significava baixar o tempo total de prova para menos de 2 horas). A partir dali, todas as fabricantes começaram uma guerra tecnológica para desenvolver o melhor tênis, até que a IAFF (Federação Internacional de Atletismo) baixou normas para ditar o que é permitido ou não.Em um evento não-oficial, Kipchoge conseguiu baixar das 2 horas de tempo total em uma maratona, em um evento da INEOS em Berlin. E o tênis foi um dos fatores com que fizeram chegar nessa marca.Poderíamos citar diversos outros exemplos, como o uso de profissionais para treinamento de trabalho de pit-stops (troca de pneus e manutenções rápidas), como foi o caso da Williams em 2012, que contratou o ex-atleta olímpico Michael Johnson para isso. Mas, talvez tenhamos evidências suficientes para confirmar que sim, o automobilismo é um esporte, onde várias pessoas tem como objetivo principal derrotar seus adversários na pista, dentro de um regulamento técnico regido por um orgão superior competente.Espero que tenham gostado, até a próxima!

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